Casos de estupro de vulnerável crescem 6,8% em um ano no RN

Foto: Ney Douglas 


“Eu perdi minha mãe quando tinha 6 anos. Quando isso aconteceu, eu fiquei em casa com meu pai e meus irmãos maiores de idade. Quando meu pai saía para trabalhar, eu ficava com eles e, aos 7 anos, começaram os abusos. Todos os dias, todas as noites. Eu fui molestada até os 9 anos e resolvi sair de casa”. O relato é de Maria (nome fictício), vítima de violência sexual sofrida quando era uma criança.


Sem apoio familiar, Maria passou a dormir em calçadas e alpendres, trabalhou como empregada doméstica ainda criança e mentia ao falar que tinha lugar para dormir à noite. Casos como esse não acontecem de forma isolada e, recentemente, estiveram em evidência no Brasil.


Maria conta que, mesmo tendo perdoado seus agressores, se arrepende de não os ter denunciado. “Quando a gente cala, consente esse tipo de violência. Tem que chegar em uma autoridade e realmente falar o que está se passando dentro da própria casa, porque é onde mais acontece”, afirma a vítima.


Os casos de estupro de vulnerável contra meninas cresceram 6,8% em um ano no Rio Grande do Norte, saindo de 316 casos em 2020 para 340 registros em 2021. Os dados estão no Anuário Brasileiro da Segurança Pública, divulgado na última terça-feira 28.


De acordo com o documento, os casos de estupro contra mulheres diminuíram no RN. Em números absolutos, os casos saíram de 175 para 154 entre 2020 e 2021, uma diminuição percentual de 12,7%.


Segundo o anuário, em 2021, os índices de estupro no Brasil mostram que as vítimas são majoritariamente mulheres (88,2%). Desse percentual, 61,3% são meninas de até 13 anos, sendo a maior concentração na faixa de 5 a 9 anos, com 19,1% das vítimas, e de 10 a 13 anos, que reúne 31,7% dos registros.


Essas vítimas se enquadram na Lei 12.015/2018 do Código Penal, referente ao estupro de vulnerável – violação sexual praticada contra qualquer pessoa que tenha até 14 anos de idade ou que seja incapaz de consentir sobre o ato, seja por conta de sua condição (enfermidade ou deficiência) ou por não possuir discernimento para tal.


Conforme informa o anuário, a busca para denunciar esse tipo de violência aumentou no país. No ano passado, 66.020 boletins de ocorrência de estupro e estupro de vulnerável foram registrados no Brasil, um aumento de 4,2% em relação a 2020.


Para a promotora de Justiça, Érica Canuto, à frente do Núcleo de Apoio à Mulher Vítima de Violência Doméstica do Ministério Público do Rio Grande do Norte, mesmo que o número oficial de denúncias tenha crescido no país, ainda são poucas as mulheres que registram a violência e pedem providências, tanto por sentirem vergonha quanto por acharem que quem a violentou irá mudar.


“A violência é muito maior do que consta nos números. O aumento no registro significa tanto que a violência aumentou quanto que existiram mais chances e decidiram denunciar”, afirma.


Abusador pode ser uma pessoa conhecida

Ainda de acordo com as informações do anuário, 8 em cada 10 casos registrados no ano passado no Brasil foram de autoria de uma pessoa conhecida. Esse fator contribui para que o crime se torne ainda mais complexo, pois os caminhos de denúncia ficam ainda mais complicados.


A promotora Érica Canuto explica que, nesses casos, o criminoso é alguém que apresenta um vínculo familiar ou afetivo com a vítima, uma história, e que por isso “a rede de proteção tem que estar preparada para fazer o acolhimento dessa demanda específica. É preciso realizar uma busca ativa, para alcançar a mulher e promover a intervenção nos serviços de apoio. Denunciar pode salvar a vida da mulher”.


Além da denúncia, a promotora acrescenta que os meios de proteção devem ser intensificados quando relacionados às crianças e adolescentes, através da educação sexual nas escolas. “Falar sobre violência de gênero nas escolas é uma lei federal e deve ser cumprida, para ensinar professores e funcionários como agir diante dos casos que têm conhecimento e para que crianças consigam identificar que alguns atos são abusos e não afeto, e que encontrem suporte e acolhimento para denunciar”, explica.


Atendimentos às vítimas

A violência sexual traz, consequentemente, grandes traumas para a vida das vítimas, tanto físicos quanto psicológicos, e devem ser tratados por profissionais.


Segundo a psicoterapeuta Sarah Moura, aquelas mulheres que sofrem abuso sexual começam a se colocar como as próprias culpadas pela violência, desenvolvendo bloqueios para se relacionar. Por isso ,“é necessário tratar essa mulher para que ela reduza esses sintomas”.


É necessário que haja apoio psicológico, assim como uma rede de apoio familiar para trabalhar o medo instaurado pelo trauma.


“Infelizmente o julgamento é muito grande. Por isso, busque ajuda profissional, confie em um familiar e faça a denúncia”, reitera Sarah. (Sob a supervisão da jornalista Nathallya Macedo).


Agora RN

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